domingo, 26 de julho de 2009

Construindo o Conhecimento Histórico


Desembarque da arquiduquesa d. Carolina Leopodina no Rio de Janeiro (Charles Simon Pradier, 1818- Museu Histórico Nacional).

História da Vida Privada: A Vida Como Ela é.

Cap. 2 - De mala e cuia.

Parece que o Brasil é uma eterna burocracia, digo isto porque remontar o passado imperial do país acaba por revelar fatos que nos parecem familiares ainda nos dias de hoje. Exemplo disso foi a transferência da corte portuguesa para o Rio de Janeiro, que além de trazer a família real e o governo da metrópole para cá, trouxe também um gigantesco aparato administrativo, que contava com mais de 2 mil funcionários régios e indivíduos que exerciam funções relacionadas com a coroa, além de setecentos padres, quinhentos advogados, e duzentos “praticantes” de medicina que residiam na cidade. A soma total era cerca de 15 mil pessoas que vieram de Portugal para o Rio de Janeiro. Só para se ter uma idéia da força de tal empuxo burocrático, vale aqui uma comparação com a transferência da capital dos Estados Unidos da Filadélfia para Washington em 1800, aonde o contingente de funcionários do governo federal não chegava a mil, levando em conta desde os cocheiros do serviço postal até o próprio presidente John Adams.

Mas nem só de Portugal vinham os lusitanos, vários administradores e colonos de outras partes do Império português migraram para o Rio, principalmente vindos de Angola e Moçambique. Logo em seguida, com a fase de instabilidade política que Portugal estava enfrentando, o Rio de Janeiro até meados do século manteve boa parte dos interesses lusitanos anteriormente transferidos para o Brasil. Além dos portugueses alguns setores da monarquia espanhola saem dos países sul-americanos tomados por revoluções republicanas e mudam-se para o Rio de Janeiro, único refúgio de legalidade monárquica no Novo Mundo.

Com a falta de dados mais precisos, fica difícil saber precisamente o tamanho do fluxo migratório em direção à nova corte sul-americana. Mas pode-se perceber as mudanças comparando os dados dos censos realizados na cidade em 1799 e 1821. Entre uma e outra data, a população urbana subiu de 43 mil para 79 mil habitantes, sendo que o contingente de habitantes livres mais que dobrou, passando de 20 mil para 46 mil indivíduos.

Com esse enxerto burocrático ocorreu também uma procura de moradias, serviços e bens diversos, o que atraiu para o Rio mercadorias e moradores fluminenses e mineiros. Não se pode deixar de fora os africanos que chegavam aos montes, transformando a baía de Guanabara no maior terminal negreiro da América. Embora a maioria desses indivíduos fossem destinados a zona agrícola, um número crescente de escravos será retido no meio urbano para atender a demanda de serviços: entre 1799 e 1821 a percentagem de cativos no município salta de 35% para 46%.

É bem verdade que a mudança da corte portuguesa para terras tupiniquins trouxe uma série de benefícios e alterou o cenário brasileiro. Mas é também verdade que como tudo que acontece dentro de nossas terras, vem acompanhado de uma enorme e espalhafatosa burocracia. Eis um dos motivos para dizermos que vivemos em uma “grande nação”, uma grande e burocrática nação. Continuem acompanhado a série, uma ótima semana e contem História!



Luiz Lampreia Jr.





quarta-feira, 15 de julho de 2009

Bibliografia Receitada


A Virgem Dos Rochedos (Da Vinci)



Você conhece o Renascimento ?

O Renascimento, também conhecido como Renascença, é o maior e mais conhecido movimento da Modernidade. Mas de onde exatamente viria tamanha importância de tal movimento? Para isso é necessário que façamos um retorno á Europa medieval, já no fim da Idade Média, quando a Idéia de fim do mundo era bem presente no imaginário europeu, devido a três principais fatores: fome, doenças e violência. Diante disso as instituições da época se mostravam incapazes de solucionar tais problemas.

É nesse contexto que surge a Modernidade e que a Europa irá reerguer-se através do Renascimento, que é um movimento de transformações radicais na sociedade européia, especialmente pelas suas características humanistas, racionalistas e cientificistas, as quais mudaram totalmente a mentalidade européia, e baseado na cultura antiga, ou seja, um movimento que resgatava os valores da Antiguidade.

É importante mostrar ainda que, embora o Renascimento seja lembrado como um movimento puramente artístico, ele foi presente em todos os setores desde o artístico até o econômico e político. Além disso, ele não se deu da mesma forma em todos os lugares variando o tempo e o modo como ocorria de acordo com os locais.

Tal fato pode ser muito bem visto na obra de Nicolau Sevcenko, O Renascimento, um livro de leitura agradável e simples que nos proporciona um maior e melhor entendimento sobre o Renascimento, a partir de uma breve contextualização histórica do quadro da época para só então seguir uma reflexão acerca do papel do Humanismo, principal característica da Modernidade e, portanto, do Renascimento, juntamente com o desenvolvimento e transformações artísticas e, finalmente, a evolução da Renascença nos diferentes lugares da Europa.

Me utilizo, aqui, das palavras de Sevcenko: “Estarão querendo pintar um “quadro renascentista do Renascimento”? descubra você mesmo através dessa história fascinante. Procure O Renascimento, leia e descubra se você realmente conhec esse importante movimento da Idade Moderna.



Dedico esse texto ao meu namorado Jandson, que tanto me incentivou, e à professora Ferdinanda, que me proporcionou a leitura dessa obra.



Nara Soares



SEVCENKO,Nicolau.O Renascimento. São Paulo: Atual,1994

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Construindo o Conhecimento Histórico

Os Cercamentos: Um violento choque social

O início da Idade Moderna (fim do século XIV e começo do século XV) é marcado por uma série de transformações, muitas delas ligadas ao campo das mentalidades, como a nova relação que o homem passa a ter com a morte distanciando-a cada vez mais de si. Entretanto a transformação que quero enfatizar aqui teve sua repercussão ligada ao campo social: o movimento de cercamentos ou enclosures. Mas que movimento é este que chega a ser tão citado nos documentos e até mesmo em obras literárias desse período?

Tal movimento é denominado dessa forma devido ao fato das terras antes tidas como comunais serem cercadas e transformadas em pastos para gado lanígero. Segundo alguns autores, o nascimento desse movimento que trouxe tanto descontentamento ao campesinato está ligado a um jogo econômico. No momento em que há uma queda nos preços dos cereais e uma elevação no preço da lã, a burguesia latifundiária, pela força, substitui a primeira cultura pela segunda.

Essa expulsão das massas camponesas provocará diversas revoltas, algumas até culminando na destruição dos valados, restituindo-os como terras comunitárias, claro que tais fatos representam uma exceção. Com o intuito de diminuir os conflitos tenta-se implantar leis que promoviam a reconstrução de algumas cidades que foram abandonadas para criação dos rebanhos, todavia essas não renderam êxito.

De fato o resultado mais expressivo dos cercamentos está na ida das massas desapropriadas às cidades, promovendo um inchaço urbano, marcado pela grande quantidade de mendigos, ou como alguns documentos denominam, vagabundos, haja vista que estes só sabem trabalhar a terra.

É nesse contexto que, a meu ver, surge uma grande contradição: a promoção da mendicância ao crime. Não bastasse retirar a terra do camponês, terra esta onde cresceu e viu seus pais serem enterrados, ainda o transformava em criminoso por não ter ocupação.

Outra consequência do movimento de cercamentos é a gênese de uma nova classe: o operariado. Como os camponeses já não tinham mais suas terras (antiga ferramenta de subsistência) vão encontrar no trabalho assalariado sua principal fonte de sobrevivência, marcando assim um novo momento onde o meio de produção é oferecido ao produtor sob a recompensa de um salário, marcando o que viria a ser o afastamento cada vez maior entre o produtor e o meio de produção, e por sua vez o apogeu da mão-de-obra assalariada.

Finalizo por dizer que o movimento de enclosures foi cruel com o camponês que viu-se obrigado a adaptar-se a uma nova forma de vida- a vida urbana- sendo injustiçado por uma minoria que exercia o poder pelos bens que possuía, fato não tão distante dos nossos dias, tendo em vista que são as classes mais baixas injustiçadas a troco da perpetuação de uma classe mais abastada.



Jandson Zé



domingo, 12 de julho de 2009

Construindo o Conhecimento Histórico


História da Vida Privada: A Vida Como Ela é.

Cap.1- Uma nova abordagem.

Para iniciar da melhor maneira possível meus trabalhos no blog, decidi trabalhar um dos temas mais instigantes da História (ao menos para mim), que é a História da vida privada. Pensando didaticamente, trabalhar o cotidiano de gerações passadas pode aparecer como uma ótima alternativa para alterar um pouco a rotina economia-politica-economia, que na maioria das vezes transforma uma das mais importantes e belas disciplinas escolares, em uma tarefa enfadonha e desestimuladora, tanto para os alunos, quanto para os professores, que acabam por se tornarem reféns do comodismo mantido pelo sistema de ensino brasileiro. Dessa forma, trabalhar algo mais próximo aos alunos é sem dúvida de extrema importância, haja vista que procurar estabelecer paralelos entre o cotidiano destes com o daqueles agentes históricos do passado, pode transformar uma simples aula de História em um verdadeiro desafio para os estudantes, tornando o papel do educador em algo muito mais interessante. Não que os processos históricos mais tradicionais sejam deixados de lado, afinal eles ainda são extremamente necessários para a formação dos docentes, mas ficar preso a eles é um erro. O educador precisa “incrementar” seu trabalho em sala de aula, para conquistar a atenção e o interesse dos alunos.

Dito isto, trabalhar o cotidiano de gerações passadas apareceu como uma excelente alternativa para iniciar minhas postagens, visto que procuro sempre buscar novas propostas didáticas para enriquecer meu trabalho. Além de que, no próximo período de meu curso de História, será trabalhada a disciplina História do Brasil Império, uma fase de extrema importância para o desenvolvimento do país como unidade nacional, e também para a formação identitária do povo brasileiro. Para entender estes processos, darei início a uma série de artigos, baseados na obra “História da Vida Privada” vol.2, que tem o seguinte subtítulo: Império: a corte e a modernidade nacional, e é organizada por Luiz Felipe de Alencastro[1]. Trabalharei aqui o texto “Vida privada e ordem privada no Império”, do próprio Alencastro, que pretende analisar os modos de vida que tiveram continuidade e os núcleos que constituíram a sociabilidade brasileira contemporânea. Esse texto mostra como se organizava o cotidiano nos lares brasileiros e como se davam as relações de poder e sociabilidades dentro do contexto imperial.

Espero que esta série possa auxiliar no entendimento do tema, e também na pratica de ensino do mesmo em sala de aula. Á medida em que os artigos ficarem prontos os publicarei, portanto sempre estarei postando eles uma ou duas vezes por semana. Espero que o tema possa ser bem compreendido e que novas idéias surjam ao longo dos trabalhos. Um abraço e contem História!


Luiz Lampreia Jr.



[1] Luiz Felipe de Alencastro nascido em 1946 em Itajaí, Santa Catarina, formou-se em história e ciências políticas na Universidade de Aix-en-Provence (França) e doutorou-se em história na Universidade de Paris-Nanterre. Ensinou nas universidades de Rouen e Paris-Vincennes. Desde 1986 é professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap). Atualmente é professor visitante da cátedra de História do Brasil da Universidade de Paris-Sorbonne. Organizador do volume 2, Império - A corte e a modernidade nacional, da História da vida privada no Brasil (dirigida por Fernando Novais), colabora em vários jornais brasileiros e é colunista da revista Veja.